quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Por vezes tarda demais...




in Público

Criminosos nazis: Aribert Heim terá vivido e morrido no Cairo 

Maria João Guimarães



Afinal, o "Dr. Morte" já não estava vivo – há vários anos. Aribert Heim, o médico austríaco que era um dos mais importantes criminosos nazis ainda procurado, terá morrido no Egipto aos 78 anos, segundo uma investigação da estação de televisão alemã ZDF e do jornal norte-americano "New York Times".

Os jornalistas tiveram acesso à certidão de óbito, que indicava que Heim morrera de cancro em 1992.

A morte de Heim tinha sido já anunciada – um antigo coronel israelita afirmara que o tinha morto nos anos 1980, uma afirmação que o Centro Simon Wiesenthal classificou como “pura fantasia” –, tinha mais tarde sido dada como provável, mas depois algumas pistas levaram investigadores do Centro Wiesenthal, que leva a cabo uma operação para deter os últimos criminosos nazis, a acreditar que Heim ainda estava vivo. Tratava-se de uma conta bancária em seu nome, com uma soma considerável, que a família não tinha reclamado.

Uma filha de Heim vive no Chile; achou-se que o "Dr. Morte" poderia estar na zona da Patagónia, já que a América do Sul foi usada por muitos criminosos nazis para refúgio: Adolf Eichmann, o responsável pelo transporte de judeus para campos de concentração, foi raptado por agentes israelitas em 1960 na Argentina; Josef Mengele, o “anjo da morte” conhecido pelas experiências que conduziu no campo de Auschwitz, passou grande parte da vida na Argentina e morreu no Brasil, Klaus Barbie foi extraditado da Bolívia para França.

Heim era o único criminoso nazi do mundo perseguido por uma task-force especial, uma unidade da polícia de Estugarda, dedicada apenas à recolha de informações sobre este caso: era o símbolo máximo para os “caçadores de nazis”. No site do Centro Wiesenthal lê-se ainda a recompensa: 310 mil euros, vindos dos governos alemão e austríaco e do próprio Centro Wiesenthal. O investigador do centro Efraim Zuroff – que ainda recentemente tinha estado na América Latina na peugada de Heim – reagiu em choque à notícia, dizendo que o centro se preparava para aumentar a sua parte na recompensa.

Experiências que testavam os limites da dor
O médico das SS trabalhou, no início da década de 1940, nos campos de concentração de Sachsenhausen, Buchenwald (na Alemanha) e Mauthausen (na Áustria), sendo que as suas mais terríveis experiências foram relatas no último.

Heim assassinou, segundo descrições de pessoas que estiveram em Mauthausen, centenas de pessoas testando os limites da dor, com experiências macabras, por exemplo, com injecções de substâncias como gasolina dadas directamente no coração, retirada de órgãos de pessoas saudáveis, ou operações sem anestesia.

Sabe-se que ficou com pelo menos um crânio de uma pessoa que assassinou como recordação, e conta-se que tinha o hábito de inspeccionar os dentes de quem pretendia assassinar para depois poder oferecer os crânios dos mortos.

Depois do fim da guerra, Heim foi encontrado pelas forças americanas em 1945, e ficou detido pelos militares dos EUA durante dois anos e meio. Mas não chegou a ser acusado por crimes de guerra.

O "Dr. Morte" exerceu como ginecologista depois de ser libertado em 1947, em Bad Nauheim e depois em Baden-Baden, na Alemanha. Em 1962 desapareceu, provavelmente alertado da iminente acusação pelas autoridades da Alemanha Ocidental.

Heim, ou Farid, um homem atlético convertido ao islão
Sabia-se que Heim tinha vivido desde então na Argentina, Uruguai, Espanha e também no Egipto – o Centro Wiesenthal afirma que se pensava até que tinha trabalhado como médico para a polícia egípcia.

Agora, o "New York Times" e a ZDF dizem que Heim se chamou, durante os seus anos no Egipto, Tarek Hussein Farid. Entre as particularidades do homem alto e atlético, que se convertera ao islão, estava uma caminhada diária pelas ruas do Cairo até à mesquita Al Azhar, e um grande interesse pela fotografia – embora fotografasse tudo o que via, nunca se deixava fotografar.

O "tio Tarek", como era conhecido pelos filhos dos amigos a quem costumava levar doces, vivia num hotel no Cairo. O "New York Times" conta que na investigação conjunta com a ZDF a família Duma, proprietária do hotel, teve durante anos guardada uma pasta com ficheiros desde testes médicos até finanças pessoais e documentos vários, e até um recorte de uma revista alemã sobre a operação que o tentava apanhar.

Entre os documentos encontrados no Cairo, estava uma carta que escrevera à revista alemã "Der Spiegel" dizendo que só não tinha sido apanhado pela polícia “por pura sorte” quando já viva no Egipto, comentado uma reportagem na revista publicada em 1979. “Não estava em casa”, dizia Heim na carta – que não se sabe se chegou a enviar à revista

Alguns documentos estavam em nome de Heim, outros de Farid, e um mostrava que Tarek Hussein Farid tinha nascido em Radkersburg, Áustria, no dia 28 de Junho de 1914, o mesmo local e data de nascimento do Dr. Morte.

Mas o próprio "New York Times" admite, no artigo sobre Heim, que o local onde foi enterrado continua a ser um mistério.

O filho, Rüdiger Heim, contou aos jornalistas que quis seguir o desejo do seu pai e doar o corpo à ciência, mas que isso seria difícil num país como o Egipto, onde as regras muçulmanas pedem um enterro rápido. Um dos membros da família Duma, que ficou íntima de Farid, queria enterrar o defunto no jazigo familiar.

Um dos membros da família Doma contou que ele e o filho de Heim subornaram um funcionário do hospital para ficar com o corpo, mas as autoridades descobriram e assim Farid, ou Heim, teria assim acabado por ser enterrado anonimamente, numa vala comum.

E assim, diz o "New York Times", apesar destas novas provas sobre a vida do "Dr. Morte", é impossível fechar definitivamente o seu caso.

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