quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

A Norte a Chuva Parou (b)

De tudo quanto possuia, tinha consciência que a profissão, o estatuto, era o mais valioso. Mas não numa perspectiva de importância a nível da carreira, de destaque perante os outros ou de possuir um poder que mais ninguém obtinha. A importância, a validade, estava nas pequenas coisas que, dia a dia, ia conquistando na sua ausência para com a relatividade do mundo. Sim, tudo era passageiro, finito. Num dia vives, no outro morres. Mas gostava de apreciar o recosto confortável do seu cadeirão, a madeira lisa e fria da sua secretária, a sua sala quente e acolhedora nas manhãs de inverno, no pico de Janeiro. A empregada que lhe trazia um café a ferver e o computador que lhe abria caminhos a um novo mundo. Um mundo onde todas as suas ilusões e devaneios se imprimiam num conjunto inacabado e confuso de caracteres.

Ela escrevia. Uma escrita do tipo de escritor psicótico à beira do suicídio, que transporta para o papel todos os devaneios que, com ou pouca lógica, lhe vão atravessando o pensamento. Ela era como eles, os seus personagens, que ignorando o mundo em que viviam - sem interesse, sem história - encontravam no além uma existência bem mais praseirosa e que resultava, sobretudo, da imaginação.

Doces momentosa aqueles! Quando ela passava tardes a fio fechada sobre si, aconchegada na sua superioridade e importância de não poder ser interrompida enquanto fazia outro trabalho que não era o que lhe competia. A chuva na rua, tempestade de vento, folhas, agitação nervosa dos passantes, um torbilhão de rotinas e acidentes que volviam o mundo do avesso, enquanto ela escrevia.


«O pequeno Tomás corria sem descanso na enconta encarpada. Caiu e morreu. Partiu para o céu. E finalmente foi feliz».

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

catarse

ser por ser
quem também tem de contar
aparecer por ser
com pena de te olhar
um bem
um bem maior
que não fui capaz de ter
pela certeza
inquieta
de te ter
bem longe
junto de mim