quarta-feira, 14 de novembro de 2007

um dia bem passado...



A Norte a Chuva Parou (a)

Sete pedaços de terra. Batida. Molhada. Ensopada pela lama e pelo tempo. Um vaso plantado junto da porta da entrada. Ela sai. Das sementes que plantou nasceu uma pequena erva. Qualquer dia dará uma rosa. Mas apenas qualquer dia... Hoje, continua a ser apenas mortiço, fraca imagem do esplendor que pdoerá vir a alcançar.


Ela afasta-se da casa e da flor com caminhar alto e atento. Nada a perturba, nada lhe espanta. A terra que utilizou para fazer nascer, para breve, esplendorosa criação, provoca-lhe indiferença. Os homens são seres vis, sem interesse, que povoam as cidades e os campos para neles apenas plantarem o que possuem de mais ruim. Ela acredita que não foi para isso que foram criados, que Deus ou um qualquer ET os colocou no mundo. O planeta não foi feito para suportar os homens, apenas o cosmos.


Dia a dia, caminhando na sua rotina diária, anseia pelo momento em que um meteoro vai, por fim, terminar com uma existência fútil. A política não á nada. A solidariedade não é nada. O bem e o mal, a liberdade e a escravatura são conceitos abstractos sem razão de ser. Apenas o mundo existe, todo o resto é alternativo, varia nas estações e nas épocas, faz parte de uma humanidade que existe enquanto lhe for autorizado que permaneça. O planeta vai suportando. Mas haverá o dia em que o fim pedirá o seu ponto final.


Porque plantou, então, uma planta? Porque deixou parte de si em algo de subjectivo? Nem ela própria o sabe. Há muito tempo que deixou de tentar compreender as contradições do seu comportamento. Sentiu aquela necessidade e pronto! Queria ver algo crescer, queria ter parte de si a possuir significado. Mesmo que tal, para os outros, nada significasse. Porém, tinha vergonha. E caminhava apressadamente agora, temendo confronatar-se consigo própria.


No trabalho acham-na estranha, alheada até do que faz. O patrão avisava-a constantemente da sua ausência da realidade, do que a rodeava de humano, das conversas sem nexo, dos mexerios sem futuro, das piadas sem comédia. Ela tornava a encolher os ombros. Para qu~e importar-se? Nada daquilo ficaria. Apenas o tempo e o nada.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

depois de s. martinho

pedaços


mal amados


crenças


mal preparadas


amores


desencontrados


vidas


inacabadas




tesouros


em ilhas desertas


prateleiras


de colecções


paixões


e brincadeiras


bicicletas


e ilusões




carinho


de alguém que desconheço


sensações


de medo e de frio


quantos males


daqueles que conheço


ainda surgirão


no meu caminho




vida


amarga


sabor


sem subtileza


amor


quase por nada


o navio afunda


e continuo


imersa




janelas


de vidro pintado


liberdade


que não consigo pegar


recordações


do tudo que é nada


hoje tenho vontade


de choras

Chocolate Suiço

Olhando o que conquistei, compreendo que fui genuina. Mas, que tenho? De que pedaços de matéria é feita a minha existência? Sim, tenho encontrado muito do que procuro! Mas aquilo que verdadeiramente anseio está num plano quase inalcançável, uma área tão longínqua quanto pode ser a do sonho.


Sou marinheira de um navio que não sei comandar... Nunca soube. Do que possuo tudo é nada, é um vazio daquilo que realmente desejaria ser, ter, construir. De que servem, afinal, as vitórias se, passado o seu tempo, mais nada são que marcas na memória? Ou nem isso! Que glórias são essas que muitas vezes nem registadas ficam? Esquecemo-las, como se esquecem os minutos sem história do dia a dia.


Um dia alguém virá fazer a minha biografia. Imagino um neto. Escreverá: "A minha avó estudou em tal, tal e tal e tirou o curso de tal em tal. Casou no dia x do ano x. A minha/ meu mãe/pai nasceu x anos depois. Os meus tios em anos x. A minha avó trabalhou toda a vida em...". E se não tiver filhos? O que de mim ficará?


Quando se fala em egoismo penso em filhos. Deve ser o único egoismo extremo que a sociedade não condena e facilmente incentiva. Ter algo a partir do qual nós próprios continuaremos a viver por longas gerações. Um pedaço de nós que não morre nem se apaga. Mas quando eles não existem, que é feito de nós? De que valeu termos vivido? Viver só por viver, que importância tem isso?


Se muitas pessoas se tivessem contentado em viver apenas por viver, provavelmente o mundo não teria sofrido tanto nem nós continuariamos a sofrer. Contudo existe uma necessidade humana de querermos ser nós próprios numa sociedade sem rosto ou com demasiados rostos como exemplo. Da atitude do cego nasce a audácia do surdo. E quem não o consegue olha para todo o lado sem ânimo, sem prazer, um ponto perdido no meio da multidão.


Que saudades sinto do chocolate suiço!

O Valor da Verdade


Quanto vale a verdade? Quanto vale uma boa notícia, o scoop jornalístico? Woody Allen abordou a questão em 2006, apresentando no papel de jovem jornalista arrebatada por uma estória a sua mais recente musa, Scarlett Johanson. Mas as questões sobre os furos jornalísticos, as quezílias entre jornalistas, polícias, advogados, políticos e pessoas comuns já vêm de há várias décadas, quase tantas quantas conta a história do cinema.
O filme A Calúnia, do original americano Absense of Malice, fala de um scoop e das consequências que trouxe para todos os envolvidos. Fala de também de erros, excesso de boa fé (traduza-se o título) e do quanto está em jogo quando se procura acima de tudo uma notícia. Que se esqueçam os valores de verdade – ainda que estes estejam sempre presentes – o fundamental é descobrir quanto do que se extrai das fontes pode ser publicado.
A película aborda sobretudo o papel das fontes, o problema da confiança e da autoridade ou não em explorar situações que estão muito fora do controlo do próprio jornalista. Acreditar ou não? Publicar ou não? Importa realmente encontrar o outro lado ou esperar que este não emita nenhuma resposta. Que esquemas são necessários para de facto conseguir uma estória?
No meio de toda uma encruzilhada de palpites e enganos, a problemática da linguagem que o jornalista utiliza para vender o seu “material”. Condenar ou não? Presente ou Imperfeito, Passado ou Pretérito Mais que Perfeito? Até porque, para os jornais, «se disserem que é culpado acreditam, se não disserem não interessa». É sabido que «muitas notícias vão ser má notícia para alguém». De que interessa então aprofundar ou não a verdade? Ela está lá de qualquer forma, tem que existir uma pequena réstia dela. A forma como a tratamos é que vai estar ligada à nossa maior ou menos crença nas boas intenções de outrem.
Julgo ter, por fim, alcançado o ponto fundamental da questão. Procurando a verdade – e o jornalismo enquanto profissão, enquanto modo de vida, pauta-se sempre pela busca da verdade – qual deve ser o nosso grau de ausência de malícia. Até que ponto devemos ser cegos ao nosso próprio julgamento apenas para cumprirmos os nossos objectivos? Acorrentarmo-nos às palavras de quem pretendemos obter declarações apenas para conseguirmos uma boa estória. Valerá a pena? O que fica depois de tudo isto? O que resta da verdade?
Crenças de parte: devemos ser nós ou não voláteis? No acto da entrevista, da busca da notícia, devemos pensar nos outros ou em nós próprios? Onde termina a fidelidade ao que se nos confessa e começa a profissão, o compromisso, a responsabilidade de comunicar a história aos nossos leitores? Argumentaria que é também uma questão de ausência de malícia. Acima de tudo procurar sempre o outro lado, mesmo que este demore a responder ou nos destrua, pura e simplesmente, a estória. Ficaremos, provavelmente, sem a glória da primeira página, mas possuiremos, por outro lado, a certeza de que enquanto jornalistas, continuamos sempre à procura da verdade e não da sua sombra. Libertar-nos-emos então não só da vaidade como também das manipulações daqueles que nos querem controlar.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Cartas a um desconhecido XIV



Numa pequena aspiração às coisas que mais amo no mundo, compreendi que, afinal, não te conhecia. Quem és? Uma imagem translúcida que paira na minha memória sem traços definidos. És uma sombra. Um pedaço perdido de um quadro pintado sobre uma longa história. Cores esquecidas pela imprensa, esbatidas no prelo. Um quadro sem nome nas paredes do céu. Do meu céu.



Ajuda-me!



Uma angústia sem nome apdoera-se da minha boa vontade, do meu arbítrio. Não sou ninguém se não a conseguir dominar. Os segundos passam; que farei sem eles? Sinto-me afundar num terreno movediço que desconheço a origem. Encontrar pessoas que desconheço pela simples razão de encontrar. Vou perdendo o apreço ao que amo por uma história para contar.

momento inglório

pequena aspiração

do que gostaria de ser...


silêncio

eles estão aí

perco-me

para não te ver.


no dia em que voltares

poderei morrer

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

as coisas que mais amo...e muito mais



Mil flores

Em outros tempos

de menos procura

fui filha do sol

e de outras tempestades

enquanto viver

sob a base da loucura

serei hoje

e para sempre

a menina

sem nomes


Nome que não existe na língua

nem tão pouco

no coração

sou imagem sem rosto

à míngua

orgulho no andar

ar digno

mas de resignação


querer só por querer

é tarefa árdua

quase sem dono

mas querer por bem querer

é não voltar mais

ao princípio