segunda-feira, 12 de novembro de 2007

O Valor da Verdade


Quanto vale a verdade? Quanto vale uma boa notícia, o scoop jornalístico? Woody Allen abordou a questão em 2006, apresentando no papel de jovem jornalista arrebatada por uma estória a sua mais recente musa, Scarlett Johanson. Mas as questões sobre os furos jornalísticos, as quezílias entre jornalistas, polícias, advogados, políticos e pessoas comuns já vêm de há várias décadas, quase tantas quantas conta a história do cinema.
O filme A Calúnia, do original americano Absense of Malice, fala de um scoop e das consequências que trouxe para todos os envolvidos. Fala de também de erros, excesso de boa fé (traduza-se o título) e do quanto está em jogo quando se procura acima de tudo uma notícia. Que se esqueçam os valores de verdade – ainda que estes estejam sempre presentes – o fundamental é descobrir quanto do que se extrai das fontes pode ser publicado.
A película aborda sobretudo o papel das fontes, o problema da confiança e da autoridade ou não em explorar situações que estão muito fora do controlo do próprio jornalista. Acreditar ou não? Publicar ou não? Importa realmente encontrar o outro lado ou esperar que este não emita nenhuma resposta. Que esquemas são necessários para de facto conseguir uma estória?
No meio de toda uma encruzilhada de palpites e enganos, a problemática da linguagem que o jornalista utiliza para vender o seu “material”. Condenar ou não? Presente ou Imperfeito, Passado ou Pretérito Mais que Perfeito? Até porque, para os jornais, «se disserem que é culpado acreditam, se não disserem não interessa». É sabido que «muitas notícias vão ser má notícia para alguém». De que interessa então aprofundar ou não a verdade? Ela está lá de qualquer forma, tem que existir uma pequena réstia dela. A forma como a tratamos é que vai estar ligada à nossa maior ou menos crença nas boas intenções de outrem.
Julgo ter, por fim, alcançado o ponto fundamental da questão. Procurando a verdade – e o jornalismo enquanto profissão, enquanto modo de vida, pauta-se sempre pela busca da verdade – qual deve ser o nosso grau de ausência de malícia. Até que ponto devemos ser cegos ao nosso próprio julgamento apenas para cumprirmos os nossos objectivos? Acorrentarmo-nos às palavras de quem pretendemos obter declarações apenas para conseguirmos uma boa estória. Valerá a pena? O que fica depois de tudo isto? O que resta da verdade?
Crenças de parte: devemos ser nós ou não voláteis? No acto da entrevista, da busca da notícia, devemos pensar nos outros ou em nós próprios? Onde termina a fidelidade ao que se nos confessa e começa a profissão, o compromisso, a responsabilidade de comunicar a história aos nossos leitores? Argumentaria que é também uma questão de ausência de malícia. Acima de tudo procurar sempre o outro lado, mesmo que este demore a responder ou nos destrua, pura e simplesmente, a estória. Ficaremos, provavelmente, sem a glória da primeira página, mas possuiremos, por outro lado, a certeza de que enquanto jornalistas, continuamos sempre à procura da verdade e não da sua sombra. Libertar-nos-emos então não só da vaidade como também das manipulações daqueles que nos querem controlar.

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