segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

A verdade escondida das palavras

Por muito que se procure numa livraria ou numa biblioteca, nem sempre encontramos aquele livro, aquele conto, aquela novela, texto que efectivamente gostaríamos de ler. Com algumas excepções feitas e colocadas no devido patamar, não existe nos dias que correm um verdadeiro escritor. Refiro-me àquele autor que nos delicia com o sentido e a sintaxe das suas frases, a escolha das palavras, conseguindo-nos relegar o julgamento da história que conhecemos para a beleza de uma escrita elaborada em sentido com o momento, na exaltação perfeita das palavras. A última vez que encontrei tal escrita - tão profunda e absorvente, cativante nos elementos e nas personagens que compunha - foi nos livros do nosso caro Eça. Desse instante para hoje, muito tem passado pelas minhas mãos, livros que considerei soberbos e outros que se revelaram uma verdadeira desilusão. Reconheço que me deixo enredar frequentemente por traduções, mas existiram alguns lusitanos que também me decepcionaram. O facto é que - e julgo ser esta uma moral assente na mente de cada escritor - nem sempre a profundidade de um conto consegue acompanhar uma escrita verdadeiramente bela, quase musical, que torna a obra mais que perfeita, completa. Quando tal união é alcançada, a simbiose produz tamanha exaltação que poucos são os que conseguem passar indiferentes à obra. São muito poucos os escritores verdadeiramente completos presentes na nossa praça e com frequência julgo que outros tantos são sobrevalorizados numa glorificação desembainhada dum berço de ouro ou de uma boa lista de números na caderneta. Um destes dias encontrei um deles...
O nome de Henrique de Senna Fernandes surgiu quase por acaso - e por acaso foi anotado - no meio de uma conversa de café sobre Macau a uma jovem com vontade de embarcar o mundo mas que raramente sai da costa. Os livros e os filmes foram procurados, mas dado o limite de recursos actual apenas descobri na biblioteca da faculdade Nam Van (Praia grande) - contos de Macau. Uma série de pequenas histórias escritas entre a metrópole lusitana e a antiga colónia encravada no império do meio, mas de tal forma envolventes e sonantes que com relutância encontrei a última página e fechei o livro.
Contam-nos uma Macau inundada pelos refugiados de Hong Kong, nos inícios da segunda grande guerra, traçam-nos o perfil das tradições ancestrais e recentemente perdidas de uma terra que se move e se inquieta, sem nunca deixar de ser ela própria. Uma terra cosmopolita, mais ou menos sobre a sombra da irmã britânica, mas mesmo assim merecedora de uma contemplação própria, enaltecedora da herança do cruzamento entre dois mundos.

Para ler por curiosidade ou por amor à escrita. Não trará arrependimentos!

1 comentário:

AP disse...

porra, que grande lençol :p
mas vale a pena ler, sim senhora!
parabéns à futura jornalista asiática :)