quinta-feira, 4 de março de 2010

Crónica de Uma Morte Anunciada


“A Ilha das Trevas"


Qual é a imagem televisiva mais antiga de que te recordas? Para nós, jovens mentes ávidas de conhecimento, mas que calcorreamos este mundo há relativamente pouco tempo, as respostas podem ser tão díspares quanto os poucos anos que nos separam. Alguns dirão que se lembram de chamas, confusão, choque e tudo o que envolveu o incêndio do Chiado. Outros recordarão muita gente à volta de um muro cheio de grafitis, estando este a ser desmoronado, no que ficou conhecido pela queda do muro de Berlim. Quanto a mim, poderá não ser a minha memória mais antiga, mas recordo vagamente a visão de uma multidão a correr desordenadamente num descampado…
Naquela que foi a sua obra inaugural na área do romance, José Rodrigues dos Santos leva-nos à pequena ilha de Timor-Leste, aos seus primórdios enquanto nação independente, acompanhando os passos de Paulino da Conceição e da sua família, ao longo de 30 anos que acabam por se confundir com a história do próprio país. Desde a invasão indonésia em 1975, ainda durante a ocupação portuguesa, do massacre, que se seguiu, da população, da eterna pedra no sapato que Portugal sempre teve e que não desistiu enquanto não resolveu, da atribuição dos Prémios Nobel até ao referendo de 1999, tudo se conta neste livro emocionante de relato quase jornalístico. Ao ler não nos conseguimos libertar da sensação de que “eu vi isto!”, nós fizemos parte disto! Nós fizemos parte da história!
Este é, ao mesmo tempo, o melhor livro do jornalista, apesar de ter sido, inicialmente, um fracasso de vendas. A escrita narrativa demonstra paixão e dedicação pela história, antes de o autor cair no facilitismo de Dan Brownismos desenfreados semestrais (apesar de eu até gostar da ideia de Colombo ser português) e de teorias de fazer Descartes dar voltas no túmulo, com um Tomás de Noronha misto entre James Bond e Indiana Jones.
Tendo como ponto fulcral o massacre de Santa Cruz, fica a ideia de que, mais do que o horror, as pessoas se sentiram identificadas com a população timorense pelo simples facto de a terem ouvido rezar em português… Um livro essencial para qualquer pessoa que se sinta um leigo no passado recente das nossas ex-colónias.
Depois vieram os bestsellers…




Marta

in Mordente

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